Aurélio Santana e Raphaella Abrahão têm algo em comum: ambos passaram por seis empresas ao longo da vida. A grande diferença? Aurélio tem 66 anos e Raphaella, apenas 22. As informações são do G1.
Hoje aposentado, Aurélio é o exemplo clássico da geração baby boomer (1946–1964). Ele construiu praticamente toda a carreira em uma única firma: foram 43 anos dedicados à Anfavea. Já Raphaella, formada em relações públicas, é o novo estereótipo da geração Z (1997–2012). Nos últimos seis anos, mudou de emprego seis vezes.
Essa comparação ilustra uma das transformações mais profundas no mercado de trabalho: o conceito de sucesso profissional está sendo redefinido. Enquanto estabilidade e salário eram sinônimos de realização para os mais velhos, os jovens priorizam aprendizado, propósito e crescimento rápido.
O que mudou no mercado de trabalho
Segundo levantamento do Ministério do Trabalho, os jovens de 18 a 24 anos permanecem, em média, apenas 12 meses no mesmo emprego. Em 2024, a rotatividade dessa faixa etária chegou a 96,2%. Entre os motivos mais citados para pedir demissão estão a busca por novas oportunidades (38%), a falta de reconhecimento (34%) e questões éticas (28%). Problemas de saúde mental, estresse e baixa flexibilidade também são fatores frequentes.
Esse comportamento tem até nome: job hopping, ou “salto de emprego”. Não se trata de instabilidade, mas de uma estratégia consciente de aprendizado rápido e alinhamento com valores pessoais.
“Minha geração não quer ficar 20 anos no mesmo lugar. Fico enquanto estiver aprendendo e entregando. Job hopping não significa indecisão, mas buscar algo que faça sentido”, explica Raphaella.
Comparação entre gerações
Cada geração tem uma visão distinta sobre carreira e sucesso:
Baby boomers: valorizam estabilidade, aposentadoria segura e conforto financeiro. Aurélio resume: “O importante é chegar ao fim da carreira com saúde e poder ajudar os filhos. Isso é sucesso”.
Geração X (1965–1980): busca equilíbrio entre estabilidade e crescimento. Sylene Nakano, funcionária da Ford há 19 anos, diz que entende o racional dos mais jovens, mas ainda prioriza segurança: “Eles têm outras aspirações e acreditam que oportunidades aparecem fácil”.
Millennials (1981–1996): focam em motivação e propósito. Marcela Bruno, que trabalha há uma década na Cosan, acredita que a pressa dos mais jovens pode fazer perder oportunidades valiosas de aprendizado.
Geração Z: valoriza aprendizado rápido, ambientes flexíveis, propósito e oportunidades de crescimento. Para eles, estabilidade não é sinônimo de realização.
Por que as gerações pensam tão diferente
O sociólogo do trabalho Ricardo Nunes explica que o comportamento da geração Z é resultado de mudanças econômicas e sociais nas últimas décadas.
“Os baby boomers cresceram com a lógica do ‘trabalhar agora para viver melhor depois’, com aposentadoria garantida e estabilidade como promessa. Os jovens de hoje nasceram em um mundo marcado pela precarização, automação e a lógica do ‘se vire’”, afirma.
Antunes, outro especialista, complementa: “As novas gerações aprendem desde cedo que terão que se virar para sobreviver. A ideia de uma carreira linear, numa única empresa, perdeu força diante de um mercado que oferece menos garantias e exige mais adaptabilidade”.
O job hopping, portanto, não é apenas uma escolha, mas uma resposta a um cenário em que a fidelidade à empresa não garante segurança nem crescimento. Essa mentalidade representa um desafio extra para organizações, que precisam criar estratégias para atrair e reter jovens sem desvalorizar profissionais que ainda priorizam fatores tradicionais.
Valores que moldam cada geração
O mercado de trabalho é plural e exige compreensão das diferenças geracionais:
Baby boomers: estabilidade, carreira longa e crescimento baseado em tempo de serviço. Valorizam conforto financeiro, segurança e legado familiar.
Geração X: equilíbrio entre estabilidade e crescimento. Aprenderam a se adaptar à tecnologia sem abrir mão de princípios tradicionais.
Millennials: motivação, propósito e reconhecimento profissional. Crescer dentro da empresa e participar de projetos desafiadores é mais importante do que tempo de serviço.
Geração Z: aprendizado constante, liberdade, flexibilidade e alinhamento de valores com o trabalho. Eles não buscam apenas salários, mas experiências que deem sentido à vida profissional.
Segundo Nunes, “o sucesso profissional deixou de ser medido apenas por estabilidade ou salário e passou a incluir bem-estar, aprendizado e realização pessoal”.
Desafios para empresas
A mudança de comportamento gera desafios para organizações. Empresas tradicionais precisam adaptar práticas de gestão, comunicação e benefícios para atrair jovens talentos sem prejudicar a retenção de profissionais mais antigos.
Ambientes flexíveis, programas de desenvolvimento rápido, cultura ética e propósito claro são cada vez mais valorizados. Além disso, reconhecer e recompensar resultados rapidamente é fundamental para manter os jovens engajados.
Empresas que não se adaptarem correm o risco de perder talentos para concorrentes mais flexíveis e inovadores. O desafio é equilibrar as necessidades das diferentes gerações, criando um ambiente inclusivo e produtivo.
O futuro do trabalho
A tendência é que o job hopping continue em alta, à medida que jovens buscam experiências diversificadas e aprendizado acelerado. Especialistas recomendam que tanto profissionais quanto empresas se preparem para um cenário dinâmico, onde carreira não é mais sinônimo de permanência longa em um único lugar, mas de construção de competências, redes e propósito.
Raphaella resume bem: “Meu foco é estar em lugares onde eu aprenda e me desenvolva. Isso é mais importante do que estabilidade imediata”.
Enquanto isso, Aurélio e outros baby boomers reforçam que conforto financeiro e legado ainda são prioridades para quem prefere uma trajetória linear. A convivência entre gerações distintas é um convite à compreensão e adaptação — e à redefinição constante do que significa sucesso no mundo do trabalho.
Considerações finais
A diferença de percepção entre gerações sobre trabalho e sucesso é clara. Os jovens, representados pela geração Z, priorizam aprendizado, propósito e flexibilidade, enquanto os mais velhos valorizam estabilidade, conforto financeiro e legado familiar.
O fenômeno do job hopping é apenas a expressão de uma nova mentalidade que questiona modelos antigos e exige novas estratégias por parte das empresas. Entender essas diferenças é essencial para construir um mercado de trabalho mais inclusivo, dinâmico e alinhado às necessidades de todos.
**Com informações do G1/Globo
