O ‘esquema’ de não declarar aluguel acabou: governo cria CPF dos imóveis, obriga cartórios e prefeituras a reportarem contratos em tempo real e Receita Federal vai cruzar todas as informações automaticamente

A publicação da Instrução Normativa nº 2.275, em 18 de agosto de 2025, marcou um divisor de águas no mercado imobiliário brasileiro. A medida cria o Cadastro Imobiliário Brasileiro (CIB), apelidado de “CPF dos imóveis”, e obriga cartórios e prefeituras a reportarem imediatamente cada contrato de aluguel, compra ou venda à Receita Federal.
Na prática, o chamado esquema de não declarar aluguel chegou ao fim. A partir de agora, qualquer movimentação imobiliária, do registro de uma escritura até a assinatura de um contrato de locação, será automaticamente comunicada ao Fisco.
Como funciona o CPF dos imóveis
O novo sistema atribuirá a cada imóvel um número único de identificação, funcionando de maneira semelhante ao CPF das pessoas físicas.
Com esse número, a Receita poderá:
-
Saber quem é o proprietário legal do imóvel.
-
Identificar quem paga aluguel e quem recebe.
-
Cruzar as informações com as declarações de Imposto de Renda.
Além disso, os contratos de gaveta e os aluguéis sem recibo perdem espaço. Assim que uma transação for registrada no cartório ou declarada à prefeitura, o sistema vai alimentar automaticamente a base de dados da Receita.
Conexão em tempo real com o Cinter
Segundo o Instituto de Registro Imobiliário do Brasil (IRIB), a medida conecta todos os cartórios ao Cinter (Sistema Nacional de Gestão de Informações Territoriais).
Isso significa que:
-
Escrituras, registros de compra e venda e contratos de aluguel serão enviados em tempo real.
-
As prefeituras também terão obrigação de repassar informações do IPTU e do cadastro municipal de imóveis.
-
Em até 12 meses, a Receita terá uma base unificada, permitindo cruzamento automático de dados.
Esse sistema elimina as brechas que antes permitiam omissão de informações, dificultando a prática de sonegação.
Impacto direto para proprietários
Os locadores serão os mais impactados. A partir de agora, qualquer renda de aluguel omitida será facilmente detectada.
Se o valor não for declarado no Imposto de Renda, o contribuinte estará sujeito a:
-
Multa de até 150% do imposto devido.
-
Juros de mora calculados pela taxa Selic.
-
Possibilidade de processo por sonegação fiscal em casos graves.
Para evitar problemas, especialistas recomendam que os proprietários formalizem todos os contratos e emitam recibos de pagamento.
E para os inquilinos?
Para os locatários, a mudança pode trazer benefícios. Isso porque a comprovação de despesas com aluguel ficará mais clara, permitindo deduções em casos previstos pela legislação.
Além disso, o registro formal garante:
-
Segurança jurídica em eventuais disputas contratuais.
-
Comprovação de residência sem depender de acordos informais.
-
Maior transparência nas relações de locação.
Por outro lado, quem insistir em contratos de gaveta corre risco de irregularidades fiscais e até questionamentos sobre a validade jurídica do acordo.
Fim dos contratos de gaveta
Uma das principais mudanças é o fim dos chamados contratos de gaveta, muito usados no mercado de locação para evitar pagamento de impostos.
Agora, a instrução normativa obriga que:
-
Todo contrato seja registrado em cartório ou informado à prefeitura.
-
Os dados sejam enviados diretamente à Receita Federal.
-
Informalidades fiquem cada vez mais difíceis de sustentar.
Esse controle deve aumentar a formalização das locações, garantindo mais transparência tanto para o governo quanto para as partes envolvidas.
O papel dos cartórios e prefeituras
A Instrução Normativa nº 2.275 impõe responsabilidades claras:
-
Cartórios de notas e de registro de imóveis precisam estar conectados ao Cinter, enviando dados em tempo real.
-
Prefeituras devem repassar informações do IPTU e do cadastro municipal.
Esse fluxo de informações cria uma rede integrada, que permitirá ao governo acompanhar o mercado imobiliário com precisão inédita.
Consequências para o mercado imobiliário
O chamado CPF dos imóveis não impacta apenas na fiscalização de aluguéis. Especialistas avaliam que a medida terá reflexos amplos:
-
Redução de fraudes em registros e escrituras.
-
Aumento da arrecadação tributária, com fim da omissão de rendimentos.
-
Maior segurança jurídica para compradores, vendedores, locadores e inquilinos.
-
Valorização da formalização no mercado imobiliário.
Por outro lado, também pode gerar um impacto imediato no bolso dos contribuintes que antes omitiam informações.
O risco de cair na malha fina
Com a integração de dados, a Receita terá condições de identificar divergências rapidamente.
Exemplo:
-
Se um cartório registrar um contrato de aluguel de R$ 2.000, mas o proprietário não declarar esse valor no Imposto de Renda, o sistema acusará a diferença.
-
Da mesma forma, se o inquilino declarar a despesa e o locador não informar o recebimento, a Receita será alertada.
Nesses casos, a consequência é cair na malha fina, com multas pesadas e cobrança retroativa.
Regularização de contratos antigos
A nova regra também obriga que contratos antigos sejam registrados corretamente. Prefeituras e cartórios terão prazo para atualizar os dados já existentes e repassar ao Cinter.
Isso significa que quem possui contratos informais antigos deve buscar regularização o quanto antes para não ter problemas futuros com a Receita.
O que dizem especialistas
De acordo com tributaristas e advogados imobiliários, a criação do CPF dos imóveis é uma medida histórica:
-
“Estamos diante de uma das maiores mudanças no controle fiscal do país. O governo vai fechar uma brecha que existia há décadas”, afirma um consultor do IRIB.
-
Para advogados, a novidade deve profissionalizar o mercado de locação e reduzir litígios judiciais envolvendo contratos informais.
O futuro do CIB e da fiscalização
O Cadastro Imobiliário Brasileiro (CIB) deve entrar em operação plena até meados de 2026, mas seus efeitos já começam a ser sentidos em 2025.
A expectativa é que, com o sistema consolidado, a Receita Federal consiga:
-
Reduzir a sonegação em bilhões de reais por ano.
-
Criar políticas públicas mais eficientes baseadas em dados reais do mercado.
-
Aumentar a transparência e confiança nas transações imobiliárias.
Considerações finais
O chamado “esquema” de não declarar aluguel chegou ao fim. Com o CPF dos imóveis, a Receita Federal passa a ter controle total sobre contratos de locação, escrituras e registros.
A mudança exige atenção imediata de proprietários e inquilinos. Quem ainda mantém contratos informais precisa regularizar a situação, sob risco de multas, juros e até processo por sonegação.
Para o mercado, o impacto deve ser positivo no médio prazo, com mais segurança, transparência e formalização. Mas, no curto prazo, o recado é claro: não há mais espaço para omissão de aluguéis no Brasil.