A princípio, parece apenas mais uma notícia sobre tecnologia e mercado financeiro. Mas, nos bastidores, o que está prestes a acontecer pode alterar o cenário das apostas no Brasil de forma inédita. Um movimento silencioso, planejado com meses de antecedência, deve colocar uma das maiores instituições públicas do país para disputar espaço com gigantes internacionais do setor.
Trata-se da entrada da Caixa Econômica Federal no universo das apostas esportivas online, uma jogada estratégica que pode redefinir a maneira como o brasileiro aposta — e, sobretudo, como o governo arrecada.
Aposta estatal: a nova era das loterias
A Caixa confirmou que lançará sua própria plataforma de apostas até o fim de novembro de 2025. O presidente do banco, Carlos Vieira, afirmou em entrevista ao Money Times que o objetivo é recuperar parte das receitas perdidas com as loterias tradicionais, impactadas pela ascensão das chamadas “bets”.
De acordo com Vieira, a nova operação deve gerar entre R$ 2 bilhões e R$ 2,5 bilhões em receitas já em 2026, marcando o início de uma nova era para a estatal.
A saber, a Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA) do Ministério da Fazenda autorizou a subsidiária Caixa Loterias S.A.a operar no setor de apostas esportivas com três marcas diferentes: BetCaixa, MegaBet e Xbet Caixa. A iniciativa visa unir a confiança do nome “Caixa” à agilidade e inovação das plataformas digitais.
Queda nas loterias tradicionais
Em primeiro lugar, a decisão tem relação direta com os números. A Caixa enfrenta queda expressiva nas receitas das loterias.
Em 2024, a arrecadação com essas modalidades chegou a R$ 27 bilhões, mas o desempenho vem caindo. Somente no primeiro trimestre de 2025, as loterias renderam R$ 5,5 bilhões, representando retração de 29% em relação ao quarto trimestre de 2024 e 10% na comparação anual.
Ou seja, a entrada no mercado digital é, ao mesmo tempo, uma reação e uma estratégia de sobrevivência. Vieira reconhece: “Os números acumulados foram menores, e isso interfere diretamente nos resultados. Nosso objetivo é que a bet esteja no ar até o final de novembro.”
O mercado bilionário das apostas online
Ademais, os dados do governo federal ajudam a entender o tamanho da oportunidade. Segundo a SPA/MF, o setor de jogos online movimentou R$ 17,4 bilhões apenas no primeiro semestre de 2025, considerando o valor apostado menos os prêmios pagos.
A média por usuário ativo foi de R$ 983, o que equivale a cerca de 10% do salário mínimo atual (R$ 1.518). Atualmente, 78 empresas estão autorizadas a operar apostas no país, somando 182 marcas diferentes.
Ainda conforme o governo, entre janeiro e julho de 2025, a Receita Federal arrecadou R$ 4,73 bilhões em tributos sobre jogos — dos quais R$ 2,6 bilhões vieram das apostas esportivas, superando os R$ 2,1 bilhões das loterias.
Ou seja, o dinheiro está migrando do formato tradicional para o digital — e a Caixa não quer ficar de fora dessa corrida.
Mega da Virada e a força das apostas nacionais
Por fim, mesmo com a perda de espaço, a Caixa segue forte com suas loterias tradicionais. Um exemplo é a Mega da Virada, que continua sendo o carro-chefe da arrecadação.
Em 2024, o prêmio atingiu R$ 635,4 milhões, dividido entre oito ganhadores — valor recorde. “Só a Mega da Virada responde por cerca de 10% de toda a arrecadação das loterias da Caixa”, afirmou Vieira.
Contudo, uma mudança de regras pode levar o prêmio de 2026 a ultrapassar R$ 1 bilhão pela primeira vez na história. O economista José Dutra Vieira Sobrinho explicou à IstoÉ Dinheiro que o aumento ocorre devido à maior porcentagem da arrecadação destinada ao prêmio e ao crescimento da venda de bilhetes ao longo do ano.
O que se sabe sobre a “bet da Caixa”
A nova plataforma, cujo nome comercial ainda será confirmado, deve operar via aplicativo e site oficial, integrando o ambiente das Loterias Caixa.
A princípio, a operação permitirá apostas tanto online quanto em casas lotéricas, ampliando o alcance e a conveniência para o público.
Principais pontos já divulgados:
Lançamento: até o final de novembro de 2025;
Operação: administrada pela Caixa Loterias S.A.;
Marcas registradas: BetCaixa, MegaBet e Xbet Caixa;
Canais de aposta: online e presencial (loterias físicas);
Previsão de faturamento: até R$ 2,5 bilhões em 2026;
Autorização: concedida pela Secretaria de Prêmios e Apostas do Ministério da Fazenda.
Desafios e riscos da aposta digital
A entrada da Caixa em um setor competitivo traz vantagens, mas também riscos significativos.
A saber, a concorrência é intensa: empresas privadas já dominam o mercado com plataformas modernas e marketing agressivo. A Caixa precisará investir em tecnologia, design e experiência do usuário para competir.
Além disso, o banco estatal deverá equilibrar sua imagem institucional com a exploração de um produto de alto risco social. Por isso, o foco no “jogo responsável” será essencial.
No aplicativo das Loterias Caixa, já existe uma seção dedicada ao tema, com orientações e limites de apostas. Espera-se que a nova plataforma amplie essas ferramentas, garantindo controle e segurança ao apostador.
O impacto no mercado e o olhar do governo
Ou seja, a chegada da Caixa ao setor deve provocar mudanças estruturais no mercado de apostas brasileiro.
Em primeiro lugar, a movimentação tende a pressionar as operadoras privadas, que precisarão se adaptar à presença de um concorrente estatal com ampla capilaridade. Ademais, pode acelerar uma nova fase de regulamentação, forçando mais transparência nas operações.
O governo, por sua vez, espera aumentar a arrecadação de impostos e reforçar o combate a plataformas irregulares, uma vez que a presença da Caixa trará legitimidade e controle estatal ao segmento.
O que esperar a partir de novembro
A estreia da “bet da Caixa” promete ser o grande acontecimento do setor de apostas em 2025. O mercado aguarda detalhes sobre layout da plataforma, esportes disponíveis, métodos de pagamento e bônus promocionais.
A Caixa aposta na confiança do público e na força de sua marca. Se o lançamento ocorrer conforme o previsto, a instituição poderá, em poucos meses, recuperar parte do terreno perdido e inaugurar um novo capítulo na história das apostas no Brasil.
E, como toda aposta, essa também envolve risco — mas, desta vez, o jogador é o próprio Estado.
