Quando o Banco Central anunciou o Pix, em 2020, o país testemunhou uma verdadeira revolução nos pagamentos digitais. Transferências em segundos, sem tarifas e sem complicação, tornaram-se parte da rotina de milhões de brasileiros. Mas agora, uma nova etapa dessa história está prestes a começar — e ela promete mudar a forma como o brasileiro lida com o crédito.
Até o fim de outubro, o Banco Central deve divulgar as regras oficiais do Pix parcelado, modalidade que permitirá o pagamento de compras em várias vezes, de forma semelhante ao que já acontece no cartão de crédito. O detalhe é que, dessa vez, o órgão regulador quer colocar freios claros: cartões não poderão ser usados como fonte de pagamento nessa nova modalidade.
Por que o Banco Central decidiu intervir
De acordo com informações da coluna de Mariana Barbosa, do portal UOL, o Banco Central vai proibir o uso do cartão de crédito para financiar o Pix parcelado. A medida busca impedir que consumidores usem o crédito do cartão para fazer novas compras via Pix e acabem entrando no rotativo, uma das principais causas do endividamento no país.
A decisão veio após relatos de que bancos e fintechs já estavam oferecendo, de forma antecipada, produtos que simulavam o Pix parcelado. Nessas versões não oficiais, os juros eram altos e havia pouca transparência sobre o custo efetivo total, algo que preocupa o Banco Central.
A principal meta é preservar a imagem do Pix como instrumento de inclusão financeira, e não como mais um meio de endividamento.

Como vai funcionar o Pix parcelado
Segundo o que já foi discutido internamente, as instituições financeiras que quiserem oferecer o Pix parcelado precisarão criar uma nova linha de crédito pessoal para o cliente.
Isso significa que o valor da compra será convertido em um financiamento separado — com boleto ou fatura específica —, e o consumidor verá claramente o custo envolvido. O sistema deverá informar:
Valor total da compra
Número de parcelas
Juros cobrados (ao mês e ao ano)
IOF e encargos
Multas e encargos em caso de atraso
O pagamento ao lojista será feito à vista, via Pix tradicional, eliminando a necessidade de antecipação de recebíveis, algo comum nas vendas parceladas no cartão. Assim, o comerciante recebe o valor integral na hora, e o consumidor arca com as parcelas junto ao seu banco.
Objetivo: combater o “parcelamento sem juros”
A criação do Pix parcelado nasce também como uma tentativa de corrigir uma distorção antiga do mercado de crédito no Brasil: o chamado “parcelamento sem juros”.
Na prática, o “sem juros” não existe. O Banco Central argumenta que os custos das parcelas estão embutidos nos preços dos produtos, criando uma falsa sensação de vantagem para o consumidor.
Ao incentivar o uso do Pix parcelado, com juros explicitados, o BC pretende tornar as condições mais transparentes e realistas. O cliente saberá exatamente quanto está pagando e por quê — sem “juros invisíveis” e sem ilusões de gratuidade.
Por que os cartões estão sendo excluídos da modalidade
O grande ponto de divergência está no uso do cartão de crédito como meio de pagamento do Pix parcelado. Caso isso fosse permitido, o cliente poderia usar o limite do cartão para pagar o Pix e, se não quitasse a fatura integralmente, a dívida migraria automaticamente para o rotativo do cartão, que tem juros altíssimos (hoje próximos de 400% ao ano).
O Banco Central quer evitar exatamente esse tipo de bola de neve. Por isso, determinou que o crédito venha de uma linha específica e independente, e não de um limite rotativo.
Além disso, o BC teme que o uso do cartão desvirtue o propósito original do Pix, transformando-o em mais uma forma de crédito disfarçado — algo oposto à sua filosofia de inclusão e baixo custo.
Bancos e fintechs já vinham se antecipando
Antes mesmo da divulgação oficial das regras, algumas instituições começaram a testar suas próprias versões do Pix parcelado.
Relatos mostram que alguns bancos vinham oferecendo o parcelamento com juros altos, sem deixar claros os custos envolvidos. Essas práticas foram vistas pelo Banco Central como um risco à imagem do sistema de pagamentos instantâneos.
A resposta foi imediata: o lançamento, que estava previsto para setembro, foi adiado para o fim de outubro, justamente para permitir a padronização das regras e evitar distorções.
O impacto no dia a dia dos consumidores
Com a limitação ao uso do cartão de crédito, o Pix parcelado tende a atingir especialmente os consumidores de baixa renda. Segundo estimativas do próprio Banco Central, cerca de 60 milhões de brasileiros não possuem cartão de crédito — mas usam o Pix diariamente.
Para esse público, a nova modalidade será uma alternativa mais simples e acessível de parcelar compras, sem precisar recorrer a cartões ou empréstimos tradicionais.
O funcionamento será parecido com um pequeno financiamento pessoal: o cliente faz o Pix, o comerciante recebe na hora e o pagamento é feito ao banco em parcelas.
A grande diferença é a transparência. Ao contrário das compras no cartão, onde muitas taxas ficam escondidas, o Pix parcelado mostrará todos os custos de forma clara e direta.
Transparência e proteção ao consumidor
As regras que o Banco Central pretende divulgar até o fim de outubro devem obrigar os bancos a seguir um modelo padronizado de informações.
Isso inclui a exibição clara das taxas, IOF, juros e valores totais a pagar, de modo que o cliente entenda o compromisso assumido antes de confirmar a operação.
A instituição também deixará claro que não será permitido “rolar” a dívida do Pix parcelado — ou seja, se o consumidor atrasar uma parcela, o banco não poderá transferir o saldo para o rotativo ou oferecer novo crédito automaticamente.
Essa limitação é vista como essencial para evitar o superendividamento, problema que atinge hoje mais de 70 milhões de brasileiros segundo dados da Serasa.
Quando o Pix parcelado será lançado
Apesar da expectativa em torno do lançamento, o Banco Central informou que a nova modalidade só deve estar disponível aos usuários a partir de março de 2026.
Até lá, as instituições financeiras terão tempo para adaptar seus sistemas, criar linhas de crédito específicas e treinar equipes para oferecer o produto com segurança e clareza.
O cronograma oficial será apresentado junto às regras na próxima semana, com os primeiros testes previstos para o início de 2026.
O que esperar daqui para frente
A criação do Pix parcelado marca uma nova etapa do sistema financeiro brasileiro, que passa a unir inclusão, crédito e transparência.
Ao limitar o uso do cartão de crédito e exigir informações claras sobre juros e taxas, o Banco Central tenta corrigir práticas nocivas que há anos alimentam o endividamento no país.
Mais do que uma simples inovação, o Pix parcelado deve redefinir o consumo digital — trazendo mais poder de decisão e menos armadilhas para quem compra.