Aumento do Bolsa Família atinge em cheio a busca pelo emprego e pega todo mundo de surpresa; veja a decisão
A ampliação dos benefícios do Bolsa Família nos últimos anos desestimulou a procura por emprego, principalmente entre grupos considerados mais vulneráveis. Essa é a conclusão de uma pesquisa do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre).
Mulheres, jovens e trabalhadores com baixa qualificação, especialmente das regiões Norte e Nordeste, são os mais afetados por essa influência do programa.
“Um dos maiores determinantes da oferta de trabalho são os programas sociais. Esses programas fornecem o apoio necessário para que as pessoas superem alguns obstáculos, como a falta de qualificação ou recursos para buscar emprego, mas também podem desincentivar a busca ativa por trabalho, especialmente quando os benefícios da assistência superam os do emprego remunerado”, aponta o estudo.
Realizado por Daniel Duque, mestre em ciências econômicas pela UFRJ e pesquisador do FGV Ibre na área de mercado de trabalho, o estudo utilizou dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, conduzida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O pesquisador esclarece que a metodologia proposta busca analisar o impacto da expansão das transferências de renda na participação da força de trabalho em diferentes regiões do Brasil.
Duque argumenta que, diferentemente de estudos anteriores sobre o tema, sua pesquisa “procura aplicar uma estratégia de identificação causal para explorar essas dimensões“.
São analisados dados de 2019, 2022 e 2023. No ano anterior à pandemia, o efeito do cruzamento dos dados entre o recebimento do auxílio e a participação no mercado de trabalho é quase nulo. Ou seja, receber os repasses não afetava a relação dos beneficiários com o mercado de trabalho.
Contudo, o estudo verificou que, nos anos mais recentes, quando o valor médio do benefício triplicou em comparação ao período pré-pandemia de Covid-19, o recebimento do auxílio passou a influenciar diretamente na redução da participação no mercado de trabalho.
Esse efeito permanece praticamente inalterado até o momento, conforme os dados mais recentes da pesquisa, referentes ao segundo trimestre de 2024.
A pesquisa mostra que esses efeitos – de desestímulo à participação no mercado de trabalho – são mais evidentes nas regiões Norte e Nordeste do Brasil, e têm uma influência marcante entre jovens, mulheres e trabalhadores menos qualificados.
“Essa tendência sugere que as políticas e instrumentos avaliados impactam de maneira desproporcional essas categorias, que podem ser mais sensíveis às mudanças nas condições econômicas e nos incentivos oferecidos por programas sociais”, diz o trabalho.
Beneficiário avalia custo-benefício de permanecer ou sair do Bolsa Família
Sobre os resultados do estudo da FGV Ibre, Claudio Shikida, doutor em economia e especialista do Instituto Millenium, considera lógica a troca entre o desejo de trabalhar e o de receber o benefício.
“As pessoas respondem a mudanças no custo das oportunidades que estão diante de si. O que você escolheria? Uma vaga de emprego no qual o salário livre de impostos não é lá grandes coisas, ou ficar em casa e receber um valor mais baixo com o Bolsa Família, mas podendo trabalhar informalmente, sem carteira assinada, garantindo um valor adicional que, somado ao benefício, deixa o indivíduo com o mesmo valor do salário livre de impostos?”, questiona o economista.
O atual Bolsa Família tem uma “regra de proteção” para incentivar o trabalho formal. Essa norma permite que as famílias continuem recebendo o benefício após conseguir emprego com carteira assinada, desde que a renda não ultrapasse meio salário mínimo por pessoa da família, independente da idade.
Nesse caso, as famílias podem ficar no programa por até dois anos, recebendo 50% do valor do benefício original, incluindo os extras para crianças, adolescentes, gestantes e nutrizes.
O governo informa que 2,64 milhões de famílias se beneficiaram dessa regra este mês, com valor médio de R$ 372,07 por família.
O desafio é que, para o beneficiário, o emprego formal precisa compensar a redução do Bolsa Família, além de possíveis ganhos informais atuais.