Isenção de Imposto de Renda até R$ 5.000 começa a valer mas vem com surpresa: governo cria nova tabela progressiva, taxa dividendos acima de R$ 50 mil e aplica alíquota mínima de 10% sem cortar gastos públicos, entenda quem ganha e quem perde
A promessa de ampliar a isenção do Imposto de Renda para trabalhadores assalariados foi finalmente apresentada pelo governo federal. Quem ganha até R$ 5.000 por mês passará a ficar livre do tributo, em uma medida anunciada como alívio fiscal para a classe média. Porém, junto com a novidade, vieram compensações que devem pesar no bolso dos mais ricos: a criação de uma alíquota mínima de 10% para rendimentos acima de R$ 50 mil e a taxação de dividendos distribuídos mensalmente nesse patamar.
A medida tem caráter imediato, mas já provoca debate acalorado entre economistas, empresários e parlamentares. O ponto central é que a isenção não virá acompanhada de cortes de gastos públicos, o que levanta dúvidas sobre a sustentabilidade fiscal da iniciativa.
Como funciona a nova tabela do Imposto de Renda
A principal mudança anunciada pelo Ministério da Fazenda é a criação de uma nova faixa de isenção. Trabalhadores formais (CLT) com rendimentos mensais de até R$ 5.000 não terão desconto de Imposto de Renda.
A seguir, entra em vigor uma tabela progressiva intermediária para rendimentos entre R$ 5.000 e R$ 7.350, que busca corrigir distorções. Sem essa tabela, haveria situações em que quem recebe R$ 5.100 poderia acabar levando menos para casa do que alguém isento com salário ligeiramente menor.
Já os salários de R$ 7.350 até R$ 50 mil permanecem sob as mesmas regras atuais, com alíquotas progressivas que chegam ao teto de 27,5%. A novidade aparece acima desse patamar: mesmo quem já paga a alíquota máxima poderá ver sua carga aumentar, já que passa a vigorar uma alíquota mínima de 10% para rendas declaradas acima de R$ 50 mil.
Dividendos entram na conta
Uma das maiores mudanças está na tributação de lucros e dividendos. Atualmente, profissionais liberais e empresários que atuam como Pessoa Jurídica (PJ) pagam impostos pela empresa e recebem dividendos totalmente isentos na Pessoa Física.
Com a nova regra, quem recebe dividendos superiores a R$ 50 mil por mês passará a pagar imposto. A alíquota inicial é de 10%, mas pode variar conforme o valor declarado.
Um exemplo prático: um médico que hoje recebe R$ 55 mil mensais em dividendos não paga nada como pessoa física. Com a mudança, ele passará a pagar algo em torno de 2,5% a 3%, e essa carga pode subir à medida que o montante cresce.
Além disso, dividendos remetidos ao exterior sofrerão taxação adicional de 10%, medida que mira empresas que utilizam paraísos fiscais ou holdings internacionais para reduzir a carga tributária.
Super ricos na mira
De acordo com dados levantados pelo economista William Ribeiro, cerca de 200 mil brasileiros, equivalentes a apenas 0,1% da população, concentram rendas médias de R$ 392 mil por mês. Esse grupo, classificado como “super rico”, paga em média apenas 7,4% de Imposto de Renda na pessoa física.
Nos 10% mais abastados desse grupo, a média de contribuição cai para 3%. Segundo o governo, a alíquota mínima de 10% foi criada justamente para corrigir essa distorção.
Apesar disso, especialistas alertam para possíveis manobras de planejamento tributário que podem reduzir o impacto efetivo da medida, como a fragmentação de rendimentos entre familiares ou empresas distintas.
Governo fala em justiça fiscal, mas evita cortes de gastos
Em nota oficial, a Casa Civil afirmou que as mudanças “promovem mais justiça fiscal”, transferindo parte da carga para quem ganha mais, enquanto milhões de trabalhadores de baixa e média renda serão beneficiados.
Porém, o projeto não prevê cortes de gastos públicos para compensar a perda de arrecadação com a isenção até R$ 5.000. Esse ponto acendeu o alerta entre economistas.
“Sem corte de despesas, essa medida é apenas uma realocação da carga tributária, e não uma redução. O governo passa a arrecadar mais de quem ganha muito para financiar a isenção de quem ganha pouco, mas não resolve o problema estrutural das contas públicas”, avalia William Ribeiro.
Resistência política no Congresso
A proposta será enviada ao Congresso Nacional e já enfrenta resistência. Partidos como União Brasil e Progressistas estudam apresentar emendas para suavizar a tributação de dividendos, enquanto a oposição pressiona por cortes de despesas como contrapartida.
Deputados da base governista, por outro lado, afirmam que o objetivo principal é cumprir a promessa de campanha de ampliar a isenção do IR e aliviar a classe média, mesmo que isso signifique onerar mais os que ganham acima de R$ 50 mil.
Nos bastidores, parlamentares ligados ao setor empresarial temem que a taxação de dividendos desestimule investimentos ou gere uma corrida para novos modelos societários que escapem das regras.
Impactos econômicos previstos
Especialistas avaliam que o efeito prático da medida será misto:
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Trabalhadores assalariados de baixa e média renda terão alívio imediato no bolso, o que pode aquecer o consumo.
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Profissionais liberais e empresários de alta renda podem buscar alternativas para reduzir o impacto tributário, como reinvestir lucros em vez de distribuí-los.
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O setor financeiro deve monitorar os reflexos sobre investimentos externos, já que a tributação de dividendos enviados ao exterior pode reduzir a atratividade de operações fora do país.
A curto prazo, o impacto na arrecadação será compensado pelo aumento da cobrança sobre dividendos e super ricos. Mas, sem corte de gastos, há risco de pressão fiscal a médio e longo prazo.
O risco da disputa eleitoral antecipada
Analistas também apontam que a medida pode ganhar forte peso político. Em vez de ser parte de uma reforma tributária ampla e estrutural, o projeto tende a se transformar em arma eleitoral.
Com eleições presidenciais em 2026, a discussão sobre a isenção do IR pode ser usada como vitrine pela base governista, enquanto a oposição deve explorar a ausência de cortes de gastos e o aumento da carga para profissionais de alta renda.
Essa disputa pode travar o debate de fundo: a necessidade de uma verdadeira reforma tributária que simplifique impostos, reduza distorções e torne o sistema mais eficiente e competitivo.
Resumo do que você viu até aqui
Ganha:
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Trabalhadores assalariados com rendimentos até R$ 5.000 (isenção total).
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Classe média com salários entre R$ 5.000 e R$ 7.350, beneficiada pela nova tabela progressiva que evita distorções.
Perde:
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Profissionais liberais e empresários com dividendos acima de R$ 50 mil, que passam a ser tributados.
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Super ricos com renda declarada acima de R$ 50 mil, que pagarão alíquota mínima de 10%.
A ampliação da isenção do Imposto de Renda é uma vitória simbólica para o governo, que cumpre uma promessa de aliviar a carga sobre milhões de trabalhadores. Porém, a medida vem acompanhada de mudanças que podem gerar forte resistência entre os mais ricos e no Congresso.
O impacto econômico imediato deve ser positivo para o consumo das famílias, mas especialistas alertam que, sem cortes de gastos, a política pode se mostrar insustentável a médio prazo.
No fundo, o projeto deixa claro um dilema recorrente no Brasil: aliviar a carga da base da pirâmide significa necessariamente cobrar mais dos que estão no topo, já que os gastos públicos continuam crescendo. A disputa agora será política e promete dominar a pauta econômica até as eleições de 2026.